sábado, 30 de julho de 2011

OS CÓDIGOS DE LEONARDO DA VINCI

Conforme palavras de Leonardo, registradas em seu primeiro Caderno de Anatomia, o mestre florentino produziu ao longo de toda sua vida, mas sobretudo a partir de 1499, quando então contava com 47 anos, pelo menos 120 volumes de anotações e desenhos, equivalentes a mais de 10.000 páginas, das quais se acredita que apenas a metade tenha chegado aos dias atuais, espalhadas por diversas coleções públicas e privadas em todo o mundo. Tais coleções, na maioria das vezes encadernadas em volumes até bastante consistentes, o mundo convencionou chamar de códigos, entre os quais se destacam, pela dimensão e conteúdo, o Código Atlântico e o Código do Vôo, mas também o Código Trivulziano, o Código Windsor, os Códigos Madri I e II, os Manuscritos da França (designados pelas letras de A a M e que totalizam 964 folhas), o Código Hammer (hoje Bill Gates) e diversos outros.

O Código Atlântico é considerado a mais surpreendente e importante coleção de manuscritos de Leonardo da Vinci existente no mundo: são cerca de 1.119 folhas, num total de 1.750 desenhos e, portanto, uma impressionante coleção, tanto do ponto de vista quantitativo, quanto do ponto de vista qualitativo. Pode ser comparada a uma espécie de compêndio enciclopédico da obra científica e também artística de Leonardo.

Tem sua origem nas vicissitudes que envolveram os manuscritos de Da Vinci logo após a sua morte. Sabe-se que Leonardo morreu em 2 de maio de 1519, no palácio de Clos Lucé (antigamente chamado de Cloux e localizado nos arredores da corte real francesa de Amboise), onde passou a viver em 1516 a convite do Rei da França, tendo deixado em testamento todos os seus manuscritos a seu discípulo predileto, Francisco Melzi.

Francisco Melzi, filho de uma nobre família italiana, conservou todo esse material como uma relíquia, como um tesouro valioso de seu mestre. Todavia, o mesmo não ocorreu com seus herdeiros e quando veio a falecer em 1570, os descendentes de Francisco Melzi abandonaram todos os escritos de Da Vinci em um sótão da mansão da família em Vaprio d’Adda, localizada às portas de Milão, onde ficam esquecidos e descuidados por um bom tempo, até que tem início seu processo de dispersão pelo mundo.

Contrariamente a um grande número de artistas e cientistas que têm seus nomes e obras valorizados somente após a sua morte, Leonardo já era respeitado e admirado mesmo em vida e, portanto, suas obras sempre tiveram grande valor (basta lembrar que Bill Gates pagou por cada uma das folhas do Código Hammer o equivalente a US$ 1 milhão). Um valor que não foi percebido pelos descendentes de Francisco Melzi, mas que não passou em branco pelos olhos de Lélio Gavardi, preceptor da família e que furtou 13 volumes de anotações e desenhos leonardescos com a intenção de vendê-los ao Grão-Duque da Toscana, Francisco de’ Médici, apaixonado colecionador de arte. Todavia, o Grão-Duque morre em 1587 sem tê-los adquirido, o que obrigou Gavardi a procurar melhor sorte em Pisa, com seu parente Aldo Manuzio.

Giovanni Mazenta, porém, pertencente a uma antiga e ilustre família milanesa, ficou sabendo desse “trafico” e agiu em modo a obrigar Gavardi a devolver o material roubado à família Melzi que, surpreendida com a honestidade de Mazenta e ainda sem se dar conta do valor do tesouro que tinha em mãos, na figura de Orazio Melzi, decide presenteá-lo com os 13 volumes então restituídos, bem como convida-lo a retirar outros desenhos de Leonardo guardados em Vaprio d’Adda.

Divulgada a notícia da indiferença dos Melzi pelos manuscritos vincinianos, começaram a bater às portas da mansão pessoas de todo tipo, na esperança de terem a mesma sorte de Mazenta. Entre essas pessoas, destaca-se Pompeo Leoni, filho de Leone Leoni, escultor predileto de Felipe II, rei da Espanha.

Propondo a Orazio Melzi dignificações junto senado espanhol, Pompeo Leoni consegue convencer Melzi a solicitar que Mazenta lhe devolvesse os manuscritos que lhe havia presenteado, com a promessa (jamais cumprida) de serem doados à corte espanhola. Dessa forma, 7 dos 13 manuscritos que estavam nas mãos de Mazenta retornaram aos Melzi para depois passarem a Pompeo Leoni. Dos 6 manuscritos que permaneceram com Mazenta, um foi doado em 1603 ao Cardeal Federico Borromeo, que fundou a Biblioteca Ambrosiana em 1609, outro passou às mãos do pintor Ambrogio Figino (e após a sua morte a seu herdeiro, Hércules Bianchi) e outro, ainda, ao Duque Carlos Emanuel de Savoia. Os outros 3 volumes permaneceram com o irmão Mazenta até a sua morte, após a qual uniram-se aos demais que estavam com Pompeo Leoni.

Percebendo que os manuscritos não seguiam uma ordem particular desejada por Leonardo, Leoni inicia na década de 1580 um trabalho de desmembramento de todas as suas páginas, cortando e mudando sua ordem, de maneira a obter volumes de maior expressão. Também tinha a intenção de separar os desenhos puramente artísticos daqueles de cunho tecnológico e científico. Desse trabalho resulta o Código Windsor, formado por 600 desenhos montados em 234 folhas e, atualmente, conservado na Biblioteca Real de Londres, bem como o Código Atlântico, custodiado na Biblioteca Ambrosiana, considerada a biblioteca cívica de Milão, sua instituição cultural por excelência.

De certa forma, o trabalho de desmembramento dos cadernos vincinianos também teve o objetivo melhor conserva-los e facilitar seu manuseio. De fato, Leonardo não usou papel de tamanho padronizado, mas realizou suas anotações em folhas de tamanhos variados, às vezes irregulares, em alguns casos escritas somente na frente, em outros também no verso, o que dificultava um pouco seu manuseio. Então, Pompeo Leoni decidiu colar as folhas de Leonardo de vários tamanhos em folhas de um único formato, aliás, o maior formato possível, cortando janelas para os casos de manuscritos com anotações na frente e no verso, criando uma espécie de passe-partout. Dessa forma, ao lê-las, o leitor não tinha mais que tocar os originais, mas apenas as folhas de suporte.

A folha de maior tamanho no século XVII era a de formato atlântico, ou seja, a que era usada para imprimir e confeccionar os chamados atlas, razão pela qual o mais completo código vinciniano tem o nome de Atlântico.

Com a morte de Pompeo Leoni, o Código Atlântico é herdado, em 1610, por Polidoro Calchi (marido de Vitória, filha de Leoni), que o vende pela soma de 300 escudos ao Conde Galeazzo Arconati, com o qual permanece, em sua mansão de Castellazzo di Bollate (nos arredores de Milão), até 21 de janeiro de 1637, quando é doado à Biblioteca Ambrosiana, juntamente com o Código do Vôo, conforme especificado no documento de doação assinado por Arconati.

O fato dos Códigos Atlântico e do Vôo terem entrado para a Biblioteca Ambrosiana após um século conturbado, no qual passaram de mão em mão, de um mercador de arte a outro, não significa um ponto final em suas peripécias, que prosseguirão na era napoleônica.

Quando Napoleão entrou em Milão, em 15 de maio de 1796, sabia exatamente quais eram os tesouros que deveriam ser transferidos a Paris para que, como dizia ele, pudessem ser tutelados. Na realidade, tratava-se da requisição de um verdadeiro espólio de guerra. Tanto é que, 9 dias antes da sua chegada a Milão, apresentou-se às portas da Biblioteca Ambrosiana Jacques Tinet, que poderia ser chamado de Ministro da Cultura francês, acompanhado do comissário de guerra Peignon, com uma lista bem precisa de obras que deveriam ser transportadas a Paris. Menos de uma semana depois, deixavam a Biblioteca Ambrosiana as caixas contendo as várias obras tomadas pelo governo de Bonaparte, as quais chegaram a Paris somente em 25 de novembro. Durante esse longo percurso foi definido o destino dessas várias caixas. Por exemplo, a caixa de no. 19, identificada como “Carton des ouvrages de Léonard de Vinci” (Papéis com obras de Leonardo da Vinci), foi destinada à Biblioteca Nacional de Paris, enquanto que outra caixa contendo “Douze petits manuscrits de Leonard de Vinci” (Doze pequenos manuscritos de Leonardo da Vinci, entre os quais, o Código do Vôo e os Manuscritos A a M) foi destinada ao Instituto da França. Essa separação foi a causa da incompleta restituição dessa obras à Biblioteca Ambrosiana ao término do domínio de Napoleão, em 1815.

Terminada a era Bonaparte, dirigiram-se a Paris os plenipotenciários das várias nações européias que, entre outras coisas, tinham a função de identificar e repatriar as obras de arte tomadas de seus respectivos países como espólio de guerra. A esse ponto, ocorre um episódio curioso e, de certa forma, cômico: Milão, após a fase napoleônica, voltou ao domínio austríaco e, portanto, a autoridade legítima encarregada de mandar um plenipotenciário para recuperar os bens artísticos tomados de Milão era a casa de Habsburgo. Esse plenipotenciário, chamado Ottenfels, era um barão, provavelmente aposentado depois de ter participado de campanhas militares e, sem dúvida, uma pessoa que não se interessava por arte. Ottenfels, ao ver os escritos de Leonardo e não conseguindo ler sua famosa grafia inversa (talvez, mesmo o idioma italiano já não lesse muito bem), tomou esses textos por relíquias chinesas e disse: "Sem dúvida, não nos pertence; é do Extremo Oriente".

Por sorte, estavam presentes nessa ocasião os plenipotenciários do Papa e, entre eles, o famoso escultor e chefe da delegação papal, Antonio Canova, ou seja, alguém que entendia (e muito) de arte e sabia bem que aquilo não era uma coletânea de escritos chineses, mas era o famoso Código Atlântico de Leonardo e conseguiu convencer o aposentado barão austríaco a levar para Milão o que é o tesouro mais importante da Biblioteca Ambrosiana. Levou consigo também cópias, tomadas como verdadeiras, de 3 dos 12 pequenos volumes que se encontravam no Instituto da França, tendo assinado um recibo no qual se comunicava que todos os manuscritos vincinianos levados da Biblioteca Ambrosiana haviam sido recuperado, com exceção de 9 pequenos manuscritos, que não haviam sido encontrados na Biblioteca Real de Paris.

As peripécias do Código Atlântico não terminaram com a época napoleônica. Tiveram um breve, mas doloroso, apêndice no século passado, em 1968, quando um funcionário da Biblioteca Ambrosiana, Anselmo Mancaello, roubou uma folha dupla do Código Atlântico para tentar vendê-la no mercado de antiguidades. Obviamente, não obteve sucesso, pois a obra era muito conhecida e terminou por devolvê-la em 13 de novembro desse mesmo ano. 

Após esse episódio, teve início um processo de restauração de todo o Código, que ocorreu entre 1968 e 1972 e incluiu a substituição de todas as folhas de suporte e sua encadernação em doze livros. Isso, naturalmente, permitiu tutelar com maior cuidado essa obra, porque claramente as folhas não podem mais ser removidas, já que estão encadernadas em volumes.

O restauro não se consistiu somente da encadernação das folhas de Leonardo, mas também da substituição do passe-partout de Pompeo Leoni, ou seja, das folhas de suporte que, atualmente, são todas novas, feitas com um papel especial, de acidez específica e tendo um cuidado especial no ponto de contato entre a folha de Leonardo e a folha de suporte, de modo a poder tutelar do melhor modo possível os manuscritos.

Uma questão de relevância que se deve colocar é: teria Pompeo Leoni usado algum critério quando montou as folhas do Código Atlântico e quando as ordenou na seqüência que ficou sendo a tradicional e que ainda hoje é a encontrada nos doze volumes do atual Código Atlântico?

A resposta quase certa é não. Talvez tenha tentado fazer isso ao separar os desenhos artísticos dos científicos, mas, ou por falta de tempo, ou por mudança de estratégia, não completou essa empreitada. O fato é que não há uma seqüência lógica. Há, na realidade, uma desordem que, no final das contas, é o que torna o Código Atlântico tão espetacular, pois a cada virada de página descortinam-se um novo tema, um novo projeto, nos mais variados campos pelos quais Leonardo transitou: óptica, arquitetura, geometria, arte e, sobretudo, mecânica e hidráulica. São encontrados no Código Atlântico, por exemplo, os estudos para a construção dos chamados Navilhos de Milão, bem como uma grande quantidade projetos de máquinas bélicas, porque, em Milão, Leonardo era patrocinado pelo Duque Ludovico - O Mouro, que não o queria somente para produzir obras de arte, mas, sobretudo, para desenvolver máquinas bélicas, armas sempre mais potentes, para as suas guerras de conquista e de defesa do Ducado.

Todas as páginas do Código Atlântico são fascinantes, mas com fascínios diferentes. Há o fascínio da página monotemática, onde em uma página inteira é dedicada ao projeto de uma obra, de uma máquina ou de uma construção, sendo possível, portanto, estudar seu conteúdo nos mínimos detalhes. Em algumas dessas páginas monotemáticas, por exemplo, Leonardo realiza o desenho integral de um mecanismo e, depois, o desenho decomposto. Por exemplo, as várias engrenagens decompostas de um mecanismo, desenhadas ao lado do mecanismo montado. Há também o fascínio das páginas realmente caleidoscópicas, onde se vê um pouco de tudo, como por exemplo, suas anotações pessoais ao lado do esboço da imagem de uma Nossa Senhora, ao lado do esboço de uma planta do Castelo Sforzesco, ao lado de um pequeno homem que caminha sobre as águas em patins que deveriam flutuar, ou um homem com as asas e seu projeto do vôo.

Atualmente, o Código Atlântico é conservado na sala dos Tesouros da Biblioteca Ambrosiana de Milão, de onde praticamente não sai.

A Biblioteca Ambrosiana, localizada a poucos passos da famosa catedral gótica de Milão, é uma das mais importantes instituições culturais do mundo, com uma coleção de mais de 450 mil livros impressos, 15 mil manuscritos originais, 3 mil incunábulos (livros impressos nos primeiros tempos da imprensa), mais de 12 desenhos e outros tantos pergaminhos, além de mais de 1500 óleos sobre tela, madeira e cobre. Além do famoso Código Atlântico, habitam a Biblioteca Ambrosiana outras obras de Leonardo: 27 desenhos, 4 incisões com os chamados “nós vincinianos”, o fascinante livro de Luca Pacioli intitulado “A Divina Proporção”, contendo ilustrações de Leonardo (entre as quais a do famoso Homem Vitruviano) e o óleo sobre madeira com o retrato do músico, provavelmente pintado em 1485.

Muito se falou até agora sobre o Código Atlântico, mas e o Código do Vôo? O que tem ele de tão especial, para ser colocado no mesmo nível de importância do Atlântico, embora tenha apenas 18 folhas, contra 1119 do Código Atlântico?

Bem, o Código do Vôo é fascinante pelo fato de certamente ter sido usado como caderno de anotações de Leonardo, onde ele escreveu e desenhou em vários períodos; inicialmente fez desenhos, entre os quais desenhos de folhas e desenhos de perspectivas anatômicas. Depois disso, escreveu com sua grafia nervosa e difícil de ler, incompreensível para muitos, falando de um tema muito instigante que é o vôo dos pássaros. Assunto tão instigante que ele mesmo intitula o caderno como "Pássaros e outras coisas" e não faz referência a outros temas. Dentro desse tema, Leonardo estuda a anatomia dos pássaros e seu comportamento durante o vôo, a ponto de desenvolver um pássaro mecânico que lhe servisse de modelo para seus estudos, bem como uma máquina capaz de fazer o homem voar, a qual pode ser considerada um irmão mais velho dos modernos planadores, ou dos concordes.

Quando entrou no Instituto da França, levado pelos representantes de Napoleão, o Código do Vôo possuía algumas folhas a mais, folhas que hoje compõem o chamado Manuscrito B, no qual se encontram anotados numerosos estudos sobre o vôo, bem como propostos diversos mecanismos de máquinas voadoras, entre as quais a mais célebre de todas, ou seja, o parafuso voador, precursor do moderno helicóptero. A separação do Código do Vôo em duas partes ocorre entre 1841 e 1844, quando lhe cruza o caminho Guiherme Libri, definido por todos como um dos mais temíveis acidentes da história dos Códigos Da Vinci.

Libri, conhecido por ser um exímio matemático, foi também um antiquário de renome e que, infelizmente, furtou importantes peças de diversas bibliotecas, revendendo-as no mercado de arte. Dessa forma, com Guilherme Libri o Código do Vôo deixa o Instituto da França, juntamente com outros importantes documentos, entre os quais algumas páginas dos manuscritos A e B.

 Os Manuscritos A e B foram vendidos na Inglaterra a Lord Ashburnhuam que, porém, devolve-os ao Instituto da França em 1888. Quanto ao Código do Vôo, sabe-se que foi desmembrado por Libri e mutilado em 5 de suas folhas (1, 2, 10, 17 e 18), as quais, entre 1859 e 1864, foram vendidas em Londres ao pintor e colecionador Charles Fairfax Murray. As demais 13 folhas foram vendidas ao Conde de Lugo, Giacomo Manzoni, que com elas ficou até sua morte, em 1889.

Em 1892, as folhas do código do Vôo pertencentes aos herdeiros de Manzoni passaram às mãos de Theodore Sabachnikoff, personagem incrível, pertencente a uma família russa de grande importância empresarial, mas também de importantes qualidades culturais e intelectuais, a ponto de ter criado uma das salas culturais mais renomadas da época em sua região (Sibéria), onde se reuniam normalmente intelectuais, mas também dissidentes e exilados políticos e por onde se formou parte da intelectualidade daquele período.

Sabachnikoff era fascinado pelo Humanismo e pelo Renascimento e, em particular, pela personalidade de Leonardo da Vinci, o que o fez passar grande parte da sua vida tentando reunir tudo o que existia pelo mundo sobre Leonardo, adquirindo muitas obras no mercado de antiguidades. Nessa sua busca, encontrou Piumati, no qual apreciava o fato de ser a única pessoa capaz de, no séc. XIX, ler a grafia invertida de Leonardo. Com Piumati, encontrou este famoso Código, o qual comprou com o objetivo de editar um fac-símile. Sabendo desse projeto, Murray cede a Sabachnikoff uma das 5 folhas de sua propriedade, a de no. 18, ignorando que as demais também fizessem parte do Código.

O fac-símile, editado pela cada Hoepli, conta com um belo prefácio de Sabachnikoff, que contém um dos mais belos retratos de Leonardo: "Leonardo da Vinci, homem universal e perfeito do Renascimento Italiano, anatomista, químico, botânico, geólogo, geógrafo, engenheiro, nós o vemos na matemática e nas ciências indutivas, precursor de Galileu e de Bacone. Artista, revela-se poeta, músico, destaca-se com primazia na escultura e na arquitetura. Com o tempo, sua figura não pára de engrandecer-se".

Terminado o trabalho de edição, Sabachnikoff decide doar suas 14 folhas do Código do Vôo ao Rei da Itália, Humberto I, que as deposita na Biblioteca Real de Turim, a qual já possuía grande quantidade de desenhos de Leonardo e por ele considerada a única biblioteca em condições de preservar esse precioso patrimônio.

Dez anos mais tarde, em 1903, a folha 17 une-se às demais em Turim. As demais faltantes (1, 2 e 10) foram cedidas ao colecionador Enrico Fatio, de Genebra, o qual as doa ao Rei Vitor Emanuel III alguns anos depois.

Termina, assim, a aventura do Código do Vôo que, em possesso de todas as suas páginas (à exceção das que compõem o Manuscrito B, ainda custodiado no Instituto da França), é hoje definitivamente conservado na Biblioteca Real de Turim.

A Biblioteca Real de Turim, única no mundo por sua preciosíssima coletânea de manuscritos, desenhos e incisões, além de volumes impressos e coleções fotográficas, tem sua origem no firme desejo de Carlos Alberto, Rei da Sardenha (que também incluía o Piemonte, cuja capital é Turim), de criar sua "wunderkammer", ou seja, um gabinete das maravilhas para onde pudesse transferir parte das suas coleções espalhadas por seus diversos castelos, mas, sobretudo, onde pudesse guardar suas aquisições feitas no mercado de antiguidades em termos de objetos e livros que tivessem pertencido ou, conforme constava em inventários, estivessem ligados à Casa Savóia e que se perderam por vários motivos, ou terminaram queimados nos incêndios que devastaram a Galeria Ducal no final da segunda metade do Século XVII, provocando graves danos inclusive à coleção de livros acumulada pelos Savóia nos séculos precedentes.

A vontade de Carlos Alberto foi a de criar uma biblioteca feita sob medida, que servisse para ele, para seu prazer, mas que também servisse para os seus dignitários e que, portanto, tivesse também uma função pública; daí surgiu a idéia de transferi-la à seção que atualmente ocupa do Palácio Real, confiando a realização dessa obra a Pelagio Palagi, que era o arquiteto da corte.

Depois, graças ao auxílio dos valorosos bibliotecários que mantinham a Biblioteca Real, foram adquiridas várias outras obras de arte, entre as quais, em 1839, uma preciosa coletânea de 2.000 desenhos italianos e estrangeiros, adquirida de um antiquário importante do local, Volpato, entre os quais se encontravam desenhos de Leonardo (incluso o famoso auto-retrato), mas também de Rafael, de Michelangelo Buonarroti e outros.

Atualmente, a Biblioteca conserva cerca de 200 mil volumes, 4.500 manuscritos, 3.000 desenhos, 190 incunábulos, 5.000 publicações do século XVI, 1.500 pergaminhos, revistas, álbuns fotográficos, cartas geográficas, incisões e impressões.

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