Cheguei aqui
com a mente cheia de dúvidas, o coração apertado por angústias e as costas
encurvadas pelo peso avassalador de uma vida, às vezes alegre, não vou negar,
mas frequentemente extremamente dura.
Se Deus é pai
de todos, como dizem, porque para alguns dava tanto e comigo parecia nem se
importar? Será que não era merecedor de sua atenção? Porque não me ouvia?
Falava eu muito baixo? Se era esse o problema, podia perfeitamente gritar!
Talvez
estivesse pedindo demais. Mas desde quando querer saúde era demais? Desde
quando querer um pouco de conforto era sonhar alto? Afinal, se meu irmão pode
viver no luxo e andar com carro do ano, porque eu não era dado o mesmo direito?
Será que querer o bem dos meus filhos era muito? E um trabalho decente, longe
daquele chefe horrível, era demais? Ah, meu Deus, sair da solidão que me
consome era, por acaso, um pedido muito especial?
E apesar de
minhas dúvidas, sempre estive em Sua busca. Bati em diversas portas, frequentei
outras religiões, li vários textos e conversei com inúmeras pessoas, sem nunca
conseguir encontrá-lo. Cheguei a duvidar que realmente existisse.
Até que um
dia, trazido por um parente, um amigo, ou pela curiosidade, entrei nesta casa.
Haviam dito que aqui era possível falar com os espíritos e como basta ser
espírito para conhecer Deus – pelo menos era nisso que acreditava – algum deles
conseguiria me levar a Ele, que tinha me dar satisfações. Aqui ele ia ter que
me ouvir!
Então tomei
passes, ouvi palestras e, num belo dia, fui convidado a participar de uma
escola, a Escola dos Aprendizes do Evangelho. Pensei no meu
intimo: mas eu não tenho tempo para frequentar uma escola ... Trabalho tanto,
tenho a família que me espera. Não é a família que eu queria, é verdade, mas
como não tenho outra e ela está lá, dependente de mim, ou eu dela, não queria
deixá-la sem a minha presença. Afinal, sem eu aquela casa não anda! Por outro
lado, se para falar com Deus, colocar as coisas a limpo, é esse o caminho,
então vou fazer o esforço. Depois, se não gostar, se começarem a falar alguma
baboseira, eu saio, pois não sou de levar desaforo para casa.
A escola
começou e, no inicio, achava tudo meio estranho. Eu, no meio daquelas pessoas
que não tinham nada a ver comigo, de mundos tão diferentes, para mais, ou para
menos. Contudo, sentia-me bem e, aos poucos, percebia que os problemas de cada
um assemelhavam-se muito aos meus próprios. Mudavam os rostos, mas as dúvidas,
as incertezas eram as mesmas. Além disso, os orientadores e todo o pessoal da
casa me abraçavam com tanto carinho que acabei me esquecendo que estava lá para
cobrar Deus por seus erros para comigo. Talvez ele também não estivesse por lá,
mas isso nem tinha mais importância, pois eu já nem sentia tanto peso sobre os
ombros. Quero dizer, às vezes tinha (e ainda tenho) minhas crises existenciais,
mas tudo parecia passar tão mais rápido. Mesmo porque, problemas, eu já me dava
conta, todos os tinham.
Passei a
olhar mais para dentro de mim, perceber meus erros e, num determinado momento,
dei-me conta que tinha muitos defeitos. Nossa, como podia ter sido daquele
jeito por tanto tempo! Tinha que mudar coisa demais na minha vida, mas por onde
começar a tal reforma íntima? Só os defeitos catalogados eram 25 itens e
certamente havia mais algum que haviam se esquecido de listar.
Ok, decidi
começar pelo orgulho! Como ele é a causa de todos os demais defeitos, acabando
com ele, ficava perfeito logo e terminava com esse negócio de ficar sofrendo,
ainda que os sofrimentos não parecessem mais tão grandes.
Mas ao
começar minha batalha, percebi que não era tão fácil me ver livre de mim, quero
dizer, daquele orgulhoso ser que vivia dentro de mim e com o qual eu havia
cortado relações – embora, de vez em quando, voltássemos a dialogar.
Aconselhado,
deixei de lado o orgulho e ataquei em outros frontes, mais fáceis de serem
vencidos por esse exercito de um homem só. Então, num dia investia contra a
vaidade, em outro contra a incompreensão, em outro ainda contra a agressividade
e assim sucessivamente.
Com o tempo,
perdi o prazer em participar das rodas informativas sobre a vida alheia, também
conhecidas como fofocas, em me lamentar sobre as dificuldades da vida ...
Também me tornei um pouco mais paciente em casa, no trabalho e no trânsito (até
deixo me ultrapassarem sem reagir).
Arrisco até a
dizer que hoje eu sou uma pessoa de fé, uma fé ainda inconstante, mas que me
auxilia a lutar contra as adversidades da vida. Posso até cair, mas me ergo em
seguida, mais rápido do que antes. Depois, tenho a ajuda dos meus companheiros
de jornada, desta casa bendita que me acolheu quando eu mais precisava.
Hoje, eu já
sou capaz de olhar para dentro de mim, onde, para meu espanto, encontrei Deus.
Eu que o procurei em lugares tão distantes, não podia imaginar que estava tão
perto de mim, inspirando-me bons pensamentos para que a reforma íntima, apenas
iniciada, nunca pare.
Acho que
aprendi a me amar e, com o tempo, sei que vou amar com a mesma força, todas as
criaturas de Deus.