O sistema de transporte
proposto serve para atender quem vem da zona lesta para o centro, os programas
habitacionais são sinônimos de urbanização de favelas, a saúde pública é focada
em ações para a população de baixa renda, os programas educacionais são pensados
para os desfavorecidos ...
Parece que quem não faz parte
do que se convencionou chamar classe trabalhadora, não merece a atenção dos
governantes que, vestidos em peles de cordeiro, durante as campanhas eleitorais
só têm olhos para quem mora em favelas, aguarda em longas filas por uma
consulta médica, estuda em escolas publicas e pega inúmeras conduções para
chegar ao trabalho.
Se as propostas fossem
coerentes, ainda poderia compreender porque dar tanta ênfase a certos
problemas. O fato é que, para alguém que tem um mínimo de discernimento, elas
não passam de isca para ganhar votos. Os problemas são legítimos. O que não é
legítimo é esse interesse repentino em ajudar a quem precisa somente a cada
quatro anos. O que não é legítimo é insistentemente abusar da boa fé da
população.
Vejam a educação, por exemplo.
Já há algum tempo fala-se em colocar 2 professores por sala para melhorar o
ensino, como se 2 professores mal pagos e mal formados fossem melhorar algo. Se
já era ruim com um, deve ficar duas vezes pior com dois. Eu estudei num escola
estadual até a 8ª serie, o que nem faz tanto tempo, tinha um único professor
por matéria, outros quase 50 colegas e, nem por isso, deixei de ir para a USP,
onde me formei engenheiro. Outros colegas de turma hoje são dentistas,
professores, administradores etc e também não parecem ter sido afetados pelo
fato de terem tido apenas um professor. O fato é que, na época, tínhamos bons
professores, que gostavam de fazer o que faziam e nem ganhavam tanto assim.
Outra coisa que incomoda no
atual sistema educacional, que também vive na boca de políticos, é a tal
criação de cotas. Não é o caso de dar uma boa base para todos, ao invés de
nivelar por baixo, criar cotas e, desse modo, dar um jeito para que quem não
aprendeu o básico entre no ensino superior. Parece que o objetivo é entrar numa
faculdade e não aprender algo. Porque não se fala em programas que estimulem a
leitura (leitura de verdade e não mini-textos publicados em redes sociais,
muitas das vezes, aliás, vem mal escritos), que favoreçam a socialização
através do esporte (que vai muito além do time do coração), que promovam um
maior afluxo de visitantes aos museus (gente, museu é fonte de conhecimento
e não coisa da elite!), que estimulem a vontade de aprender,
independentemente do título que se vai conseguir? O título, a profissão, é
consequência de todo um processo que, aliás, não termina na faculdade. Entrar numa
boa faculdade até que é fácil, mas construir um bom profissional sobre bases
frágeis é, no mínimo, irresponsável.
As bases são frágeis e, do modo
como vão as coisas, vão ficar cada vez mais frágeis, até se romperem, até não
existir mais nenhum cérebro pensante neste país, até que todos, sem exceção,
comovam-se com a bondade dos políticos em pensar somente nos pobres. Pensam nos
pobres sim, mas porque lhes são úteis, porque vendo-se tolhidos da condição de
seres pensantes são facilmente manipulados, entregando ao vento o que lhes é
mais sagrado que é o poder de escolher verdadeiros líderes, que pensem na
coletividade e não em chegar ao poder.
Governantes que se diz
preocupado somente com os pobres não é outro que populista. Vejam uma
interessante definição a respeito: "Populismo é uma forma de governar em
que o governante utiliza de vários recursos para obter apoio popular. O
populista utiliza uma linguagem simples e popular, usa e abusa da propaganda
pessoal, afirma não ser igual aos outros políticos, toma medidas autoritárias,
não respeita os partidos políticos e instituições democráticas, diz que é capaz
de resolver todos os problemas e possui um comportamento bem carismático. É
muito comum encontrarmos governos populistas em países com grandes diferenças
sociais e presença de pobreza e miséria."
Temos que acordar e a hora é
agora. Temos que desconfiar de candidato que dá depoimento ao lado da família, como
se ter família não fosse algo comum à toda sociedade (aliás, esses políticos espúrios
deveriam ser proibidos de fazer pouco do que é a célula da sociedade). Temos
que desconfiar mais de discursos com fala mansa, tão frágeis quanto castelos de
areia. Temos que investigar a vida de nossos candidatos, mas não em revistas de
fofocas. Se o candidato vai se casar com alguém mais jovem, ou mais velho, se
pinta ou não o cabelo, se é bonito ou feio, não é informação relevante. O que
conta é a origem dele como pessoa pública. Russomano, por exemplo, diz não ter
padrinho, mas iniciou sua vida como político no partido do Maluf que, se alguém
ainda não sabe, não pode sair do país, pois tem mandado de prisão decretado em
inúmeros países. Esse mesmo Maluf, aliás, com todo seu passado nem tanto
escuso, já que rouba, mas faz, acaba de firmar acordo com ninguém menos do que
o Lula, o rei do populismo, esse mesmo Lula que também já fez as pazes com
Fernando Collor de Melo, extirpado da vida pública por 8 anos mas, como uma fênix,
de novo à ativa.
Temos que ter memória,
usar a tecnologia da informação não apenas para publicar fotografias das
últimas férias e para falar de assuntos vazios. A internet abriu as portas para
uma fonte inesgotável de informações. Temos que ler, pesquisar, passar a
palavra adiante, lutar por uma sociedade melhor.
Não podemos nos esquecer porque
esse bando de políticos está sendo julgado depois de 8 ANOS. Infinitos 8 anos
para julgá-los com o risco de serem condenados somente no papel, já que depois
de 8 anos os crimes foram prescritos para penas mínimas, que são as mais
prováveis de serem decretadas.
Falo dessa gente, mas o fato é
que todos os políticos devem ser cobrados pelo que fazem. Não devem ser
considerados seres intocáveis. São gente comum, funcionários públicos, do
porteiro ao presidente, que devem, eles sim, tratar o eleitor com mais
respeito, pois é do imposto pago pelo eleitor que vem o pagamento do seu
sustento, tanto o oficial, quanto o pagamento paralelo que enriquece essa gente
ordinária e que só em época de eleições se padece da pobreza do povo.
Se não fizermos isso, com toda
razão deveremos sentir vergonha de nós mesmos por pactuarmos com os desmandos
de gente como a gente, por deixarmos, como bem disse Rui Barbosa há mais de cem anos (http://pensador.uol.com.br/frase/NTk0MDg4/), triunfar as nulidades, prosperar a desonra, deixar crescer
a injustiça, agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, a ponto do homem
chegar a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.